Contributos para uma Reflexão Estratégica sobre São Tomé e Príncipe

Não tenhamos ilusões, um amplo consenso social e político é imprescindível para o sucesso da implementação de um plano de desenvolvimento sustentável em São Tomé e Príncipe. Este plano deve ser cuidadosamente concebido, com base em consultas abertas e transparentes com todos os setores da sociedade, incluindo o atual e os antigos Presidentes da República, representantes do governo, da oposição, da academia, da sociedade civil e do setor privado.

 

No último editorial da Somosmais.org, frisamos a necessidade de agir e de contribuir ativamente para a tão almejada mudança que como São-tomenses merecemos.

Tendo como ponto de partida a celebração dos 49 anos da independência nacional, é fulcral não apenas refletir sobre as conquistas, perdas, vitórias e fracassos do passado, mas é também mais importante assumir um compromisso sério e duradouro com o presente e o futuro.

Nesta lógica, é fundamental que cada um de nós faça a sua parte, direcionando os nossos esforços para o desenvolvimento sustentável do país, reconhecendo a responsabilidade coletiva que temos na construção de uma nação verdadeiramente direcionada a suprir às necessidades de seu povo. É chegado o momento de agir em prol de um Estado que seja um verdadeiro reflexo dos anseios e aspirações da população.

Num momento em que o país enfrenta desafios económicos e financeiros significativos, em que o governo e o FMI ainda não chegaram a um entendimento sobre a correção dos desequilíbrios macroeconómicos e consequentemente sem a possibilidade de se assinar o acordo de facilitação de crédito alargado com o FMI, é crucial considerarmos alternativas viáveis.

Em face dessa conjuntura, talvez seja conveniente explorarmos outras opções além do FMI.

Essas alternativas poderiam envolver parcerias bilaterais com outros países, bem como programas de ajuda direta ao orçamento, tendo em vista a obtenção de financiamento externo, abrangendo financiamentos concessionais.

É vital que sejamos proativos na procura de soluções que possam alavancar a economia e mitigar os desafios financeiros que enfrentamos. Impõe-se diversificar as fontes de financiamento e buscar novas parcerias.

Joseph E. Stiglitz, conceituado economista e Prémio Nobel da Economia, faz no seu livro “Globalização – A Grande Desilusão” uma importante reflexão sobre a política económica global e como é que os países em desenvolvimento sentem as barreiras económicas que se erguem no seu caminho.

As suas ideias são pertinentes para refletirmos acerca dos modelos tradicionais de intervenção económica e para considerarmos abordagens mais equitativas e sustentáveis.

Como presidente do Conselho de Consultores Económicos do Presidente Bill Clinton e ex-economista principal do Banco Mundial, Stiglitz argumenta que há alternativas viáveis aos programas do FMI, programas estes que, embora possam exigir sacrifícios significativos, não estão fundados no fundamentalismo de mercado e têm tido resultados positivos.

Stiglitz destaca o Botswana como um bom exemplo e uma das poucas histórias de sucesso de desenvolvimento económico no continente africano. Ao descrever a trajetória do país, ele salienta que, quando o Botswana alcançou sua independência em 1966, era terrivelmente pobre, sendo um país essencialmente agrícola, com falta de água e uma infraestrutura rudimentar. 

Apesar dessas adversidades iniciais, o Botswana conseguiu transformar a sua economia e alcançar um extraordinário progresso ao longo das décadas. Este sucesso deve-se a uma combinação de fatores, nomeadamente uma gestão prudente dos recursos naturais, políticas de governação eficazes e investimentos estratégicos em setores-chave.

O caso do Botswana enfatiza a importância de políticas económicas bem planeadas e estruturadas e da boa governação na promoção do desenvolvimento sustentável. Ele serve como modelo de inspiração e um exemplo concreto de como países com recursos limitados podem alcançar um crescimento económico significativo e melhorar o padrão de vida da sua população.

Stiglitz destaca que, embora o Botswana tenha beneficiado significativamente dos seus recursos de diamantes, o verdadeiro sucesso do país decorre da sua habilidade em manter um consenso político baseado num amplo sentimento de unidade nacional. Ele argumenta que: esse consenso foi fundamental para o funcionamento eficaz do contrato social entre governantes e governados, e que esse consenso político não surgiu espontaneamente, mas, foi cuidadosamente forjado pelo Estado, em colaboração com conselheiros externos de várias instituições públicas e fundações particulares, nomeadamente a Fundação Ford.

O autor destaca ainda que: estes conselheiros ajudaram o Botswana a delinear um plano para o futuro do país; ao contrário do FMI, que negocia essencialmente com os ministros das Finanças e os governadores dos bancos centrais, os conselheiros explicaram abertamente e sem preconceitos as suas políticas, ao mesmo tempo que colaboravam com o governo no sentindo de obterem o apoio popular para as suas medidas. Discutiram o plano com os altos responsáveis políticos, incluindo ministros e membros do parlamento, tanto em seminários abertos como em audiências restritas.

E considera que: o êxito ficou a dever-se em parte ao cuidado com que o Governo do Botswana selecionou os seus conselheiros, e também que, o Botswana, consciente da volatilidade dos seus dois sectores principais – a pecuária e os diamantes -, tivera o cuidado de construir reservas para eventualidade de sofrer uma crise. 

O autor conclui que, desde então, O Botswana nunca mais pediu auxílio ao FMI.

O Botswana surge assim como um exemplo de sucesso no desenvolvimento económico em África, um exemplo que pode e deve servir de inspiração, desde que devidamente adaptado para se ajustar às diferentes circunstâncias e realidades de São Tomé e Príncipe.

É necessário que todos nós tenhamos a consciência da nossa trajetória coletiva nesses 49 anos, e que acreditemos que o subdesenvolvimento não é necessariamente o nosso destino, e que à imagem do Botswana é possível e é determinante reunir todos os atores políticos, incluindo o Presidente da República, o governo, as principais forças políticas, os académicos e a sociedade civil, para fomentar um amplo consenso político e arquitetar uma visão compartilhada para o desenvolvimento do país.

Ao agrupar esses diferentes atores em torno da mesa, pressupõe deixar de lado os interesses pessoais e de grupos em prol do bem comum e do interesse nacional. Esta abordagem colaborativa e inclusiva pode criar um ambiente propício para a formulação de um plano de desenvolvimento abrangente e sustentável a curto, médio e longo prazo.

Outrossim, a colaboração com conselheiros externos de diversas instituições públicas e fundações particulares, pode trazer mais valias, nomeadamente no que concerne as experiências e conhecimentos complementares para enriquecer o processo de planeamento e implementação.

Não há tempo a perder, não é hora do “leve, leve” é hora de São Tomé e Príncipe aproveitar essa oportunidade para congregar esforços, construir consensos em torno de um objetivo comum, que é o desenvolvimento de São Tomé e Príncipe, e desenvolver um plano de ação ambicioso que leve o país a um futuro mais próspero e sustentável.

Mas não tenhamos ilusões, um amplo consenso social e político é imprescindível para o sucesso da implementação de um plano de desenvolvimento sustentável em São Tomé e Príncipe. Este plano deve ser cuidadosamente concebido, com base em consultas abertas e transparentes com todos os setores da sociedade, incluindo o atual e os antigos Presidentes da República, representantes do governo, da oposição, da academia, da sociedade civil e do setor privado.

É essencial que todas as forças políticas que governam ou venham a governar o país se comprometam com este plano e concordem em respeitar cabalmente as suas diretrizes e implementar as suas reformas. Isso requer um compromisso genuíno com o bem-estar nacional acima de interesses partidários ou pessoais e a construção de um consenso amplo e duradouro.

Torna-se assim necessário estabelecer mecanismos institucionais sólidos que garantam a implementação e a continuidade do plano independentemente das mudanças de governo. Além disso, o envolvimento da comunidade internacional e de organizações multilaterais pode fornecer apoio técnico e financeiro adicional, fortalecendo assim a capacidade do país para realizar as suas metas de desenvolvimento.

O sucesso ou o fracasso deste plano dependerá da liderança, pelo que será necessário encontrar uma liderança visionária, com indivíduos capazes e credíveis, dotados de competência, que possam liderar um projeto tão importante para o país. A formação de uma equipa dedicada e eficaz para coordenar e trabalhar na obtenção do amplo consenso político e social é um passo determinante para o sucesso do plano de desenvolvimento sustentável.

Essa equipa deverá assumir um papel fundamental na identificação e recrutamento de conselheiros externos de diversas instituições públicas e fundações internacionais.

De igual modo, seria da responsabilidade da referida equipa à procura de formas de financiamento para a implementação do plano, dentre as quais a exploração de oportunidades de financiamento internacional, junto a organizações multilaterais, fundações e agências de desenvolvimento.

O desafio de promover o desenvolvimento sustentável de São Tomé e Príncipe é significativo, especialmente considerando os constrangimentos e divisões presentes na sociedade. No entanto, é importante reconhecer que esses desafios não são insuperáveis e que há caminhos viáveis para superá-los.

Hoje mais do que nunca, é necessário um compromisso coletivo com o bem comum, colocando os interesses do país acima das diferenças políticas e pessoais. A construção de pontes entre os diferentes setores da sociedade e a promoção do diálogo e da colaboração são fundamentais para alcançar esse objetivo.

É chegado o momento de juntos, mesmo sabendo que nem todos comungam da ideia de servir o país, por contraposição a ideia de servir-se do país, estarmos à altura daqueles que no início da década de 60, não se conformaram e deram início a uma luta que veio a culminar com a obtenção da independência no dia 12 de Julho de 1975.

O desafio é grande, os constrangimentos são ainda maiores, numa sociedade dividida e desconfiada e que necessita de encontrar o seu caminho rumo ao desenvolvimento sustentável, superando os obstáculos e construindo um futuro mais próspero e inclusivo para todos os seus cidadãos.