Nova Confrontação Política em São Tomé e Príncipe

Jorge Gonçalves

Opinião do Dia / 11.08.2022

A Constituição, no caso santomense, obriga a que o diploma em reapreciação parlamentar seja aprovado por maioria qualificada dos deputados, isto é, estabelece a necessidade de uma força política reforçada, não bastando nem a maioria simples nem a maioria absoluta para esse efeito.

Aproximam-se as eleições de 25 de setembro em São Tomé e Príncipe e não cessam os conflitos institucionais no país, tendo de um lado o Presidente da República e, do outro, ora o Governo, ora a Assembleia Nacional.

Em todos eles estão divergências políticas sobre o exercício dos poderes do Presidente da República e a delimitação das competências dos restantes órgãos de soberania na sua relação com o Chefe de Estado.

Agora, o conflito é com o Parlamento e com a designada “nova maioria” a propósito do Código das Atividades Francas e Offshore que aquele órgão aprovou e o Presidente vetou, decidindo não promulgar o diploma.

Na mensagem em que fundamenta a sua decisão, Carlos Vila Nova é imperativo na sua retórica de afirmação, em termos que ainda não tínhamos visto ao Chefe de Estado santomense, nem mesmo na querela com a Comissão Nacional Eleitoral a propósito da atualização dos cadernos eleitorais ou com o governo a propósito do processo de substituição do Governador do Banco Central.

A solenidade da mensagem diz tudo e, por isso mesmo a reproduzo no essencial: Quero deixar claro, tanto para dentro como para fora de São Tomé e Príncipe, tanto para os santomenses como para os estrangeiros, que não existe nem existirá, se não houver promulgação do Presidente da República, o Código das Atividades Francas e Offshore. A falta de promulgação determina a inexistência jurídica do ato, sem qualquer valor na ordem jurídica interna” – fim de citação.

Uma vez mais, Carlos Vila Nova quer afirmar-se cioso dos seus poderes constitucionais e intransigente na defesa da sua fortaleza política e do que entende serem iniciativas que põem em causa os equilíbrios institucionais e os atropelos à Constituição e à lei.

Este confronto é eminentemente político. Os argumentos são jurídico-políticos.

Na generalidade dos sistemas constitucionais semipresidenciais, é conferido ao Presidente da República o poder de exercício do veto político em relação a diplomas oriundos do governo (mais intenso) e oriundos do Parlamento (mais relativo), exigindo a fundamentação da decisão e a sua remessa aos deputados para reanálise. Mas o sistema também confere ao Parlamento a possibilidade de ultrapassar o veto presidencial através da reaprovação do diploma vetado, obrigando à sua promulgação, ou a aprovação de um novo diploma, alterado.

Só há um senão. A Constituição, no caso santomense, obriga a que o diploma em reapreciação parlamentar seja aprovado por maioria qualificada dos deputados, isto é, estabelece a necessidade de uma força política reforçada, não bastando nem a maioria simples nem a maioria absoluta para esse efeito.

Parece ser o que resulta do nº 2 do artigo 83 da Constituição da República de São Tomé e Príncipe que estabelece que, no caso de não se verificar a promulgação (pelo Presidente, diga-se) o diploma será reapreciado pela Assembleia da República e se obtiver o voto favorável da maioria qualificada dos deputados deverá o Presidente da República promulga-lo no prazo de oito dias.

A exigência da maioria qualificada delimita politicamente o problema. A coligação parlamentar que suporta o Governo tem uma maioria absoluta limitada a mais um mandato do que os partidos na oposição.

Assim, mais um imbróglio político e jurídico a animar o mês e meio que falta para as eleições.